O pronunciamento “Brasil Soberano” do presidente Lula, transmitido em 17 de julho de 2025, oferece um laboratório perfeito para entender como cada elemento visual e discursivo pode ser estrategicamente calculado para maximizar o impacto político.
Ontem o presidente Lula realizou um pronunciamento em rede nacional em resposta às ameaças de tarifação do governo Trump contra empresas brasileiras, com foco no sistema Pix. O discurso de quase 5 minutos, intitulado “Brasil Soberano”, gerou ampla repercussão na mídia nacional e internacional. Do ponto de vista da comunicação política, o pronunciamento apresenta elementos semióticos e estratégicos que merecem análise detalhada – desde a escolha do cenário e vestimenta até a seleção de palavras-chave e construção de narrativas.
Para profissionais de marketing político, consultores eleitorais e assessores de comunicação, dominar análise semiótica é diferencial competitivo. Cada campanha, cada pronunciamento, cada live nas redes sociais e cada ponto de contato com o eleitor comunica muito além das palavras ditas. Cores, cenários, gestual, repetições, contrastes – todos esses elementos influenciam a percepção do público e podem determinar o sucesso ou fracasso de uma estratégia comunicacional. O caso do pronunciamento de Lula demonstra como teoria semiótica se transforma em resultados práticos mensuráveis.
O pronunciamento de Lula não foi apenas uma resposta diplomática. Foi uma estratégia integral de comunicação que combinou comunicação eleitoral (preparação para 2026), semiótica visual (cores, cenário, postura); estratégia discursiva (palavras-chave, repetições); psicologia aplicada (contrastes, emoções).
Logo de cara, notei a escolha do terno azul e da gravata – e isso já revela uma estratégia MUITO BOA. Mas será que foi só isso?
Depois de analisar as palavras usadas, os símbolos visuais e as estratégias discursivas, destaquei 7 técnicas de comunicação política usadas no pronunciamento que você pode aplicar no seu dia a dia.
ESTRATÉGIA #1: O azul foi calculado – não foi escolha estética
A escolha do terno azul – e da gravata azul – foi a primeira jogada estratégica. E não teve nada a ver com estética.
O azul comunica:
- Moderação (evita o vermelho PT/esquerda)
- Institucionalidade (código visual do “centro responsável”)
- Confiabilidade (linguagem que o mercado financeiro entende)
- Diálogo (aproxima de conservadores moderados)
A estratégia: Conquistar o centro e os indecisos moderados.
Aplicação prática: Em qualquer momento do mandato ou de uma campanha, a escolha das cores não deve ser feita de forma casual. Cada cor comunica e deve ser usada com intencionalidade em todos os momentos.
ESTRATÉGIA #2: Cada palavra foi pensada – a ciência da repetição
Você notou que “Minhas amigas e meus amigos” se repetiu 5 vezes?
Mas a repetição estratégica foi muito além da saudação típica de Lula. Analisando quantitativamente o discurso, temos um panorama:
TOP 5 PALAVRAS QUE MAIS SE REPETIRAM:
1.”BRASIL” (23x)
2.”SOBERANIA” (8x)
3.”DIÁLOGO” (6x)
4.”POVO” (5x)
5.”DEFESA” (4x)
A jogada: Cada palavra opera em múltiplos públicos.
Aplicação prática: Em seus discursos e conteúdos, identifique palavras-chave e repita estrategicamente. A repetição é chave para o marketing político e ajuda a fixar a sua mensagem na memória das pessoas.
ESTRATÉGIA #3: O cenário comunica
A escolha do cenário foi comunicação visual estratégica:
- Decisões baseadas em conhecimento, não impulso
- Preparação – Contrasta com anti-intelectualismo da gestão anterior
- Seriedade – Resposta racional, não emocional
A estratégia: Cada elemento visual reforça a narrativa textual.
Aplicação prática: Em seus vídeos, entrevistas e pronunciamentos, o cenário comunica tanto quanto suas palavras.
ESTRATÉGIA #4: Psicologia dos contrastes – como o cérebro processa oposições
Por que o discurso foi construído em oposições binárias?
Todo o pronunciamento se baseou em contrastes psicológicos:
- Soberania × Subordinação
- Diálogo × Imposição
- Verdade × Mentira
- Patriotas × Traidores
A ciência por trás: O cérebro humano processa contrastes mais facilmente que nuances.
Aplicação prática: Estruture suas mensagens em contrastes claros. “Nós fazemos X, eles fazem Y.” “Enquanto outros prometem, nós entregamos.” Contrastes fixam na memória e facilitam a escolha do eleitor.
ESTRATÉGIA #5: A frase que grudou – “traidores da pátria” como inversão semântica
Por que “traidores da pátria” virou manchete em quase todas as matérias?
- Inversão do símbolo: Patriotismo vira arma contra o bolsonarismo
- Constrangimento público: Força adversários a se posicionarem
- Mobilização emocional: Linguagem que emociona e engaja a base
- Alvo específico: Bolsonarismo
A estratégia: Apropriar-se de símbolos tradicionalmente conservadores (patriotismo) e usá-los contra os próprios conservadores. É guerra semiótica.
Aplicação prática: Identifique símbolos que seus adversários usam e encontre formas de ressignificá-los a seu favor, se fizer sentido. “Família”, “trabalho”, “ordem” – todos podem ser disputados semioticamente.
ESTRATÉGIA #6: Escalada calculada – a comunicação continuou após a TV
O pronunciamento foi só um ponto da estratégia:
- Na TV: Tom institucional – “chantagem inaceitável”
- Big techs: Anunciou taxação das empresas americanas
- CNN Internacional: “Trump não é imperador do mundo”
A jogada: Cada canal, uma mensagem.
Aplicação prática: Não concentre sua comunicação em um único momento. Planeje escaladas estratégicas em diferentes canais e formatos. TV para institucionalidade, redes sociais para mobilização, entrevistas para aprofundamento.
ESTRATÉGIA #7: Guerra de narrativas para 2026 – cada frase mira na reeleição
Cada elemento do pronunciamento tinha dupla função: resolver a crise atual e preparar 2026:
- Ampliar coligação
- Definir inimigo comum
- Neutralizar “traidores”
- Conquistar indecisos
- Manter base
Aplicação prática: Em mandatos, toda comunicação deve ter visão eleitoral de longo prazo. Resolva crises do presente construindo capital político para o futuro.
Em pouco mais de 4 minutos de TV, o pronunciamento:
- Falou com públicos diferentes simultaneamente
- Preparou terreno eleitoral para 2026
- Tentou neutralizar adversários específicos (Eduardo Bolsonaro)
- Dominou agenda midiática
- Transformou crise em oportunidade política
Como aplicar essas estratégias na sua comunicação:
- Use cores estratégicas
- Identifique palavras-chave ou mensagens específicas e repita conscientemente
- Construa contrastes claros com adversários
- Planeje escaladas em múltiplos canais
- Escolha cenários que reforcem sua mensagem
- Mantenha visão eleitoral em toda comunicação
- Aplique psicologia na construção de narrativas
Na comunicação política, cada elemento comunica. Cores, palavras, cenários, timing – tudo é estratégia.
Para profissionais da área: Dominar essas técnicas não é opcional. É diferencial competitivo em um mercado cada vez mais preparado.
Quais estratégias você pretende aplicar na sua comunicação?
Sobre o Autor
Júlia Vigné é jornalista formada pela Universidade Federal da Bahia e Especialista em Comunicação Governamental e Marketing Político pelo IDP.
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