Ao longo da história do nosso país, as mulheres vêm tentando reverter o paradoxo da baixa representatividade nos cargos políticos, quando a maioria do eleitorado brasileiro é feminino (52%). Desde a redemocratização, no final dos anos 80, brasileiras lutam para corrigir esta contradição na ocupação de cargos de poder.
De lá para cá, muitos avanços ocorreram e o número de mulheres na política aumenta gradativamente. O Brasil vem adotando uma série de regras eleitorais para garantir a equidade de gênero e aumentar a quantidade de candidatas e também de eleitas.
Neste artigo pretendo focar em uma das mais recentes conquistas: a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2018, de determinar que 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, também conhecido como Fundo Eleitoral, devem ser destinados às candidaturas femininas.
Decisão histórica que aumentou a competitividade das postulantes a um cargo eletivo por terem, pela primeira vez, garantido o acesso à mais dinheiro para realização das campanhas eleitorais.
No mesmo ano, depois da apuração final dos votos das eleições federais e estaduais, a constatação: o número de brasileiras eleitas teve um expressivo aumento, o que mais tarde pesquisadores atribuíram ao maior acesso aos recursos públicos de campanha (os tais 30% do Fundo Eleitoral).
Mulheres nas Eleições 2020
Agora chegou a vez das candidatas a prefeitas, vice-prefeitas e vereadoras sentirem essa emoção! As eleições municipais de 2020 serão as primeiras da história a contar com essa nova legislação eleitoral e, assim como foi em 2018, a expectativa em relação ao aumento de eleitas é positiva.
O ineditismo do acesso aos recursos públicos de campanha gerou (e ainda gera) algumas dúvidas sobre como é feita a distribuição, quem tem direito ao benefício, quando ele repassado, entre outras questões.
Foi por isso que escrevi este Especial Mulheres Eleições 2020 que, neste primeiro momento, esclarece algumas questões referentes às mudanças nas regras e também sugere algumas ações propositivas para aquelas que pretendem, de fato, tomar posse do seu lugar na política brasileira.
Ele será dividido em quatro partes:
- Todas as candidatas têm direito aos 30% do Fundo Eleitoral?
- Como fiscalizar a distribuição dos 30% do Fundo Eleitoral?
- Não me encaixo nos requisitos para receber os 30% do Fundo Eleitoral, e agora?
- Medidas para fortalecer mulheres nos comandos dos partidos
IMPORTANTE: Vale deixar claro que este especial trata apenas da cota de 30% do Fundo Eleitoral, a que foi implementada em 2018, e não sobre a cota de gênero, que tornou obrigatório o preenchimento do percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas, adotado em 1995. São coisas diferentes.
Então vamos ao que interessa:
Todas as candidatas têm direito aos 30% do Fundo Eleitoral?
A pergunta que dá título a este artigo tornou-se frequente entre as candidatas após decisão do TSE que beneficiou as candidaturas femininas. A notícia se espalhou e muitas mulheres ficaram animadas achando que o acesso aos recursos públicos de campanha era prerrogativa generalizada, mas será que todas as candidatas têm direito aos 30% do Fundo Eleitoral?
Em 2018, nas últimas eleições federais e estaduais, as mulheres puderam usufruir pela primeira vez desta nova regra e o resultado foi um crescimento no número de eleitas: 51% na Câmara dos Deputados, 41% nas assembleias legislativas e no Senado o número de eleitas se manteve em sete.
As eleições municipais de 2020 serão as primeiras na história a contar com a nova legislação e as candidatas a prefeitas, a vice-prefeitas e a vereadoras deverão ficar atentas às regras partidárias que distribuem estas verbas.
Apenas o fato de ser candidata não garante o acesso aos recursos públicos de campanha, visto que a Resolução n° 23.604, aprovada em 2019 pelo TSE, não obriga os partidos a distribuírem o recurso igualitariamente entre as postulantes.
Como saber se tenho direito aos 30% do Fundo Eleitoral?
Os critérios de distribuição do dinheiro são estabelecidos pelas direções nacionais dos partidos. Isso permite que as siglas destinem a verba para candidatas que avaliam ser mais competitivas ou que tenham maior chance de vitória. Os partidos, muitas vezes, não informam como é feita a divisão, o que possibilita esse direcionamento estratégico do dinheiro.
As agremiações devem enviar ao TSE um documento informando quais os pré-requisitos necessários para a divisão e também firmando o compromisso da destinação destes recursos para as campanhas femininas.
Entretanto, é sabido que as mulheres são minoria nas cúpulas partidárias o que faz com que as prioridades na distribuição do fundo fiquem a encargo de lideranças masculinas. Uma pesquisa feita pelo jornal O Estado de S. Paulo mostrou que em 19 das 30 legendas que elegeram deputados federais em 2018 as mulheres representam menos de 1/3 da composição da executiva nacional.
No Brasil, apenas quatro partidos com representação no Congresso têm presidentes mulheres: Gleisi Hoffmann, do PT, Luciana Santos, do PCdoB, Laís Garcia, que divide o cargo de porta-voz da Rede com um homem, e a deputada federal Renata Abreu, do Podemos.
Para a candidata saber se tem direito ao recurso é preciso que ela faça parte das atividades partidárias, conheça o regimento interno, esteja atualizada sobre os critérios definidos e questione-os, caso não concorde. A fiscalização desta distribuição é importante para que seja assegurada a real competitividade entre as candidatas e para que os segmentos femininos tenham voz perante à direção do partido político.
Há um texto aqui no blog em que sugiro algumas ações para que os partidos políticos atraiam mais mulheres para o ambiente político-partidário.
Como fiscalizar a distribuição dos recursos públicos de campanha?
Este será o tema do próximo artigo que será publicado na semana que vem! Se este assunto te interessa, acompanhe os próximos textos. Até lá!