No período pré-eleitoral é muito comum pré-candidatos adotarem posturas e medidas de ações sociais junto à população mais carente, como forma de aumentar sua visibilidade nesse ano de eleição, mas em época de pandemia do Covid-19, parece que os atos se multiplicaram de forma exponencial, tendo em vista as situações adversas que tem enfrentado as camadas mais necessitadas da sociedade.
Com base nisso, muitos pré-candidatos têm utilizado os danos causados pela pandemia do Coronavírus como pretexto para participar de qualquer tipo de ação social, distribuição de alimentos, cestas básicas, produtos de higiene pessoal, chegando às raias de até mesmo aparecer em lives de artistas como forma de pegar carona na imagem de pessoas populares.
O que legislação diz sobre essas ações sociais realizadas por pré-candidatos
Recentemente, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte manteve a condenação aplicada pelo juiz eleitoral da comarca de Parnamirim a uma vereadora por distribuir sabão e álcool na cidade. A ação foi promovida pelo Ministério Público Eleitoral referente a atuação da vereadora relacionada ao Covid-19 e as Eleições de 2020.
Apesar de ainda não termos tido acesso ao acórdão (decisão do colegiado), a notícia na página do TRE-RN contém 2 informações importantes para mostrar que a postura que os TRE’s adotarão está de acordo com a linha adotada pelo Tribunal Superior Eleitoral a partir das decisões proferidas no ano 2019.
A primeira informação é a de que o“MPE entendeu que a distribuição de kits com sabão, álcool gel e panfleto com orientações para a prevenção do Covid-19 realizada pela vereadora no mês de março se configurou como propaganda política fora do prazo legal.”
Dessa informação, é possível entender que o MPE buscou a aplicação da jurisprudência do TSE, que conclui que o pedido explícito de votos se caracteriza mediante “a realização de propaganda antecipada irregular, independentemente da forma utilizada ou da existência de dispêndio de recursos” (AgR-REspe nº 060033730).
Quanto a segunda informação, esta advém da defesa da vereadora, que de acordo com o TRE-RN, “afirmou que o ato não constituiu pedido explícito de voto”.
Argumentar a ausência de pedido explícito de voto, imaginando que para sua caracterização seria necessário o emprego de expressões do tipo “vote em”, “conto com vocês em outubro” ou semelhantes, será um caminho cada vez mais difícil de trilhar levando em consideração os últimos processos julgados pelo TSE.
Ações sociais realizadas por pré-candidatos podem ser consideradas propaganda eleitoral antecipada?
Em 2019 o TSE mudou a jurisprudência do tribunal ao considerar propaganda eleitoral antecipada a publicação de outdoors em apoio ao pré-candidato à deputado estadual de Pernambuco nas eleições de 2018, ainda que sem pedido expresso de voto, com aplicação de multa de R$ 5 mil (Respe 060022731).
Naquele julgamento, o Min. Edson Fachin disse em seu voto que “é irrelevante, para a caracterização do ilícito que se configura pelo meio inidôneo [o uso de outdoors], a formulação de forma concorrente do pedido explícito de votos. Os dois ilícitos guardam autonomia, inclusive quanto à tipificação”.
O TSE também aplicou esse entendimento ao julgar recurso que tratava de propaganda eleitoral antecipada cometida pela prefeita do município de Brejão – PE (Agr. no Respe 060033730), que durante um evento festivo realizado no município fora do período eleitoral, foi instalado outdoor eletrônico que exibiu o nome de um pré-candidato a deputado federal filiado ao mesmo partido que a prefeita.
Utilizar outdoor em período pré-eleitoral à luz da atual jurisprudência do TSE é artefato reconhecido para a prática de promoção pessoal, que é considerada ilegal e não está amparado pelas exceções estabelecidas no artigo 36-A da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97), que são aquelas que definem os atos de pré-campanha permitidos.
A par desses 2 casos, percebemos que existe coerência da Justiça Eleitoral do Rio Grande do Norte ao condenar a vereadora quando olhamos para o entendimento firmado pelo TSE de que, ainda que ausente o pedido explícito de votos, atividades que são proibidas na campanha eleitoral, quando empregadas no período pré-eleitoral, também são consideradas irregulares e devem ser apenadas com a aplicação de multa.
Logo, se é proibido “na campanha eleitoral a confecção, utilização, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor”, conforme estabelece o § 6º, do artigo 39 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97), também é proibido empregar no período pré-eleitoral as formas proibidas para o período oficial de propaganda, como a distribuição de “kits com sabão, álcool gel e panfleto com orientações para a prevenção do Covid-19”.
Apesar de sabão, álcool gel e impresso com orientação referente à prevenção do chamado coronavírus não estarem entre os tipos materiais proibidos no texto da lei, não se pode esquecer da parte final do dispositivo que amplia o conceito para “quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor”.
É essa vantagem ao eleitor que é proibida! E é qualquer tipo de vantagem.
Certamente esse tipo de conduta deve ter sido praticado por diversos pré-candidatos em municípios país afora, sob as mais diversas formas possíveis de tentar relacionar o enfrentamento ao Covid-19 com as Eleições de 2020, porém os casos ainda não foram levados à apreciação da Justiça Eleitoral. Mas poderão ser.
Muito provavelmente o caso da vereadora de Parnamirim – RN tenha desdobramentos com interposição de recurso para o TSE.
Apesar disso, é muito pouco provável que o TSE modifique sua jurisprudência ao reanalisar o caso, haja vista que as mais recentes decisões da Justiça Eleitoral tem sido no sentido de parametrizar o que seria a conduta aceitável no período da pré-campanha eleitoral e quais são os elementos que configurariam a propaganda eleitoral antecipada.
O que pré-candidatos precisam considerar antes de fazerem ações sociais nas eleições municipais de 2020
Uma coisa é certa! Os pré-candidatos precisarão repensar não apenas as atividades de ações sociais nesse momento de pandemia, como também o cuidado com uso das “palavras mágicas” definidas pelo TSE, que são aquelas “que nos levam a concluir que o emissor está defendendo publicamente sua vitória” (AgR-REspe nº 0000029-31.2016.6.19.0138).
Assista ao vídeo em que o consultor e professor de marketing político Marcelo Vitorino avalia as ações sociais realizadas por pré-candidatos do ponto de vista da comunicação política: